direito do urbanismo e direito do ordenamento do território
Em
virtude do aumento das tarefas do Estados e dos interesses do individuo,
verificou-se um alargamento dos ramos especiais de Direito Administrativo.
Tornou-se necessário a tutela de novos bens jurídicos [[1]]. Surge-nos, desta forma, o Direito do Ambiente que muitas vezes é
confundido com o Direito do Urbanismo. Importa proceder a sua distinção.
O
Direito do Ambiente nas palavras de CARLA AMADO GOMES corresponde “ao conjunto
de normas que regulam as intervenções humanas sobre os bens ecológicos, de
forma a promover a sua preservação, a impedir destruições irreversíveis para a
subsistência equilibrada dos ecossistemas e a sancionar as condutas que lesem
na sua integridade e capacidade regenerativa” [[2]]. O direito do ambiente tutela, desta forma, valores ecológicos. E, por isso, deve num objeto mais
operativo.
Na
definição de Direito do Urbanismo FERNANDO ALVES CORREIA adota uma posição
ampla, enunciando que este é “o conjunto de normas e de institutos respeitantes
à ocupação, uso e transformação do solo, isto é, o complexo das intervenções e
das formas de utilização deste bem”[[3]].
Por sua vez, DIOGO FREITAS DO AMARAL defende um conceito mais restrito, uma vez
que para o autor o conjunto de normas são apenas “aplicáveis ao ordenamento
racional da cidade” [[4]].
Este ramo de direito não prevê, então, normas que disciplinem a utilização
racional dos recursos naturais.
A doutrina diverge quanto à
relação existente entre estes dois ramos de direito.
DIOGO
FREITAS DO AMARAL defende a sua autonomia.
Para
sustentar a sua posição utiliza um argumento histórico, um argumento orgânico
e, por fim, um argumento sistemático.
Quanto ao
primeiro, refere que o Direito do Urbanismo remonta à antiga civilização de
Roma [[5]],
enquanto o Direito do Ambiente é uma realidade relativamente recente, surgindo após a 2.ª Guerra Mundial.
Quanto
ao argumento orgânico enuncia que cada um destes ramos de direito é da
competência de diferentes Ministérios ou Secretarias de Estado.
Por
fim, o argumento sistemático, estes ramos de direito estão
previstos em diferentes artigos da Constituição, o Direito do Ambiente está
consagrado no artigo 66.º, por sua vez o Direito do Urbanismo encontra-se no
artigo 65.º, pelo que não se devem confundir.
Outra
doutrina considera o Direito do Ambiente como parte integrante do Direito do
Urbanismo. Segundo esta teoria o Direito do Ambiente é absorvido pelo Direito
do Urbanismo, uma vez que este prossegue os fins visados por aquele.
Esta
doutrina desconsidera as diferenças, supra citadas, entre estes ramos de
direito, pelo que não pode prevalecer entre nós.
Finalmente,
outra parte da doutrina defende o Direito do Urbanismo como capítulo do Direito
do Ambiente. O Direito do Urbanismo integraria o Direito do ambiente, porque
previa instrumentos e meios para a defesa do meio ambiente.
Esta
teoria, também não é de acolher, uma vez que consagra um conceito demasiado
amplo de Direito do Ambiente. Existem outros ramos de direito que prevêem
mecanismos de proteção do ambiente e não é por isso que integram esse ramo de
direito. DIOGO FREITAS DO AMARAL refere que esta teoria “pretende reduzir à
escravidão os outros ramos ou proceder à sua anexação pura e simples” [[6]].
Apesar
de considerar que o Direito do Ambiente e o Direito do Urbanismo correspondem a
ramos de direito autónomo, não pode deixar de se observar que estes se cruzam,
podendo haver convergência de objetivos. Como exemplo dessa relação, artigo 6.º
n.º1 a) da Lei de Bases do Ordenamento do Território e de Urbanismo.
O
Direito do Ambiente e o Direito do Urbanismo,
apesar de ramos autónomos, têm semelhanças [[7]].
Passo a enunciar.
(I) Ambos
encontram-se na Constituição, incluídos no capítulo dos direitos sociais, económicos
e culturais;
(II)
A sua
estrutura é predominantemente objetiva;
(III) Ambos
preocupam-se com o presente e com o futuro, estando sujeitos ao princípio de
solidariedade intergeracional. Esta ideia está patente, por exemplo, no artigo
5.º a) da Lei do Ordenamento e Território e de Urbanismo e artigo 66.º n.º2 d)
da Constituição.
Outro ramo de
direito que se deve distinguir do Direito do Ambiente e do Direito do Urbanismo
é o Direito do Ordenamento do Território, que nas palavras de ALEXANDRE SOUSA PINHEIRO e MÁRIO JOÃO DE BRITO
constitui um ramo de direito autónomo [[8]].
Este consiste, nos termos do artigo 5.º n.º2 b) da Lei de Bases do Ambiente,
num “processo integrado da organização do espaço biofísico, tendo como objetivo
o uso e a transformação do território, de acordo com as suas capacidades e
vocações, e a permanência dos valores de equilíbrio biológico e de estabilidade
geológica, numa perspetiva de aumento da sua capacidade de suporte de vida”.
Este ramo de direito visa a redução de desequilíbrios entre regiões,
nomeadamente entre o interior e o litoral.
O Direito do
Urbanismo circunscreve-se a um aglomerado urbano, enquanto, o Direito do Ordenamento
do Território incide à escala nacional ou regional.
Finalmente, o Direito do
Património Cultural está direcionado para o passado, visa tutelar valores
civilizacionais, ou seja, a memória de um povo. Por sua vez, o Direito do
Ambiente, como já enunciado, visa tutelar valores ecológicos.
CARLA AMADO
GOMES distingue diferentes realidades: se há combate à poluição por estar em
causa a saúde humana já não estamos perante o Direito do Ambiente, mas sim, o
Direito da Saúde Pública; a defesa dos centros históricos compete ao Direito do
Património Cultural; a melhoria do “ambiente construído” integrará a componente
da estética das edificações o que cabe ao Direito do Urbanismo; já a criação e
valorização dos espaços naturais da cidade pertence ao Direito do Ambiente [[9]].
CONCLUSÃO
A adaptação das
cidades ao desenvolvimento económico (Direito do Urbanismo) trás consequências
para o Direito do Ambiente e para o Direito do Ordenamento do Território. Essa
adaptação não é compatível com os recursos naturais que o Direito do Ambiente
visa tutelar, por outro lado, leva a uma maior disparidade entre o litoral e o
interior, uma vez que há uma tendência para a população se fixar no litoral.
Em consequência
do referido, apesar de o Direito do Ambiente, Direito do Urbanismo e Direito do
Ordenamento do Território constituírem ramos autónomos de direito, estes
interligam-se, e é necessário que atuem de forma concertada para que se
verifique uma verdadeira proteção do ambiente. A concertação entre estes três
ramos de direito é a única forma de se conseguir alcançar um desenvolvimento
sustentável.
BIBLIOGRAFIA CITADA E CONSULTADA:
·
CORREIA, Fernando Alves, “Manual de Direito do Urbanismo”, Almedina, Coimbra, 2004;
·
FREITAS DO AMARAL, Diogo, “Direito do Urbanismo”, Sumários, 1993, Lisboa;
·
FREITAS DO AMARAL, “Ordenamento do Território,
Urbanismo e Ambiente: Objecto, Autonomia e Distinções” in Revista Jurídica do
Urbanismo, n.º1, Junho de 1994;
·
GOMES, Carla Amado, “Direito do património cultural, Direito do Urbanismo, Direito do
Ambiente: o que os une e o que os separa”, in Separata da Revista da
Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Vol. 24, n.º1, Coimbra, Coimbra
Editora, 2001;
·
HOMEM, Pedro Barbas Homem, “Urbanismo, Ambiente
e Litoral”, in Revista de Direito do Ambiente e Ordenamento Território, n.º3,
Outubro de 1998;
· PINHEIRO, Alexandre Sousa/ FERNANDES, Mário João
de Brito, “Comentário à IV Revisão
Constitucional”, AAFDL, Lisboa, 1999.
[[1]] GOMES,
Carla Amado, “Direito do património
cultural, Direito do Urbanismo, Direito do Ambiente: o que os une e o que os
separa”, in Separata da Revista da Faculdade de Direito da Universidade de
Lisboa, Vol. 24, n.º1, Coimbra, Coimbra Editora, 2001, pág. 129 e 130.[[2]]
GOMES, Carla Amado, op. cit., pág. 359.[[3]]
CORREIA, Fernando Alves, “Manual de
Direito do Urbanismo”, Almedina, Coimbra, 2004.
[[4]] FREITAS DO AMARAL, Diogo, “Direito do Urbanismo”, Sumários, 1993, Lisboa, pág. 17.[[5]] FREITAS DO AMARAL, Diogo, op. cit., pág. 21.[[6]] FREITAS DO AMARAL, “Ordenamento do Território, Urbanismo e Ambiente: Objecto, Autonomia e Distinções” in Revista Jurídica do Urbanismo, n.º1, Junho 1994, Pág. 21.[[7]] GOMES, Carla Amado, op.cit.
[[8]] PINHEIRO, Alexandre Sousa/ FERNANDES, Mário João de Brito, “Comentário à IV Revisão Constitucional”, AAFDL, Lisboa, 1999, pág. 194.
[[9]] GOMES, Carla Amado, op. cit., pág. 359.
[[4]] FREITAS DO AMARAL, Diogo, “Direito do Urbanismo”, Sumários, 1993, Lisboa, pág. 17.[[5]] FREITAS DO AMARAL, Diogo, op. cit., pág. 21.[[6]] FREITAS DO AMARAL, “Ordenamento do Território, Urbanismo e Ambiente: Objecto, Autonomia e Distinções” in Revista Jurídica do Urbanismo, n.º1, Junho 1994, Pág. 21.[[7]] GOMES, Carla Amado, op.cit.
[[8]] PINHEIRO, Alexandre Sousa/ FERNANDES, Mário João de Brito, “Comentário à IV Revisão Constitucional”, AAFDL, Lisboa, 1999, pág. 194.
[[9]] GOMES, Carla Amado, op. cit., pág. 359.
Andreia Faria Soares
N.º 20680
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